domingo, 23 de março de 2008

OS CHATOS

Embarcamos no Jumbo da Bristish Airways com destino à Londres, em vôo noturno. A aeromoça conferia a inclinação das poltronas, pois, em breve, a aeronave iniciaria a corrida para alçar vôo. Uma brasileira, à nossa frente, dois bancos à direita, estava com a poltrona reclinada, posição flagrantemente inadequada para a decolagem. Advertida pela funcionária da companhia, colocou seu banco na posição correta. Mal se afastou a comissária, a jovem tornou sua poltrona à perigosa posição inclinada, numa flagrante indisciplina. Pensei: que guria chata!
Pois eles - os chatos - estão em toda a parte. No banco, brigam com o guarda, pois teimam em passar pela porta giratória carregando celulares, chaveiros e outras bugigangas de metal, mesmo sabendo que se trata de uma porta que detecta este tipo de objeto impedindo a passagem dos portadores. Ficam na fila do banco mais de meia hora, e, quando finalmente se vêem na frente do caixa, só aí, então, vão procurar na pasta o título para pagamento ou o recibo para depósito ou retirada. Quando o caixa, finalmente, termina o atendimento, permanecem ainda algum tempo na frente do funcionário arrumando os documentos na pasta, ou guardando o dinheiro na carteira. O nervosismo do restante da fila não o abala.
O chato entra no ônibus, caminha até a roleta, e, somente neste momento, resolve procurar o dinheiro que estava no bolso da calça. Mas não está ali, procura então no bolso do casaco, depois na camisa, até achar a quantia para o pagamento da passagem. Só no último momento, dá o sinal que vai descer do coletivo, quando este pára é que resolve tirar o traseiro do banco. A esta altura o restante do ônibus quer matá-lo, mas ele não liga.
No mercado, na banca de frutas resolve apertar todas para saber se estão em boas condições. Não leva as que apertou, afinal de contas elas estão amassadas.
No cinema, chega quando o filme já começou, atrapalhando os que chegaram no horário, não obedece ao aviso de desligar o celular, e atende no meio do filme. Conta o filme para o vizinho de poltrona. Adianta as cenas em voz alta.
Não existe pessoa mais chata do que brasileiro em grupo no exterior. Se você estiver lá fora, e vir um grupo de brasileiros bata imediatamente em retirada, salvo se você é chegado num vexame.
Em Paris, estávamos subindo a Torre Eiffel, esperando para pegar o elevador do primeiro estágio para o segundo, junto com uma silenciosa multidão, que conversava aos sussuros, de tal sorte que não escutávamos a conversa da pessoa ao nosso lado. Foi neste momento, que vimos uma turma de uma meia dúzia de jovens, os quais adentraram ao recinto aos gritos, berros e batidas. Um deles simulava que se atirava da torre, enquanto outro fingia que o impedia. Meu mau presságio se confirmou: brasileiros. Ficamos num constrangimento, somente interno, pois não abrimos a boca para não sermos flagrados como patrícios da turba. Abriu a porta do elevador e nos jogamos para dentro, neste momento uma das meninas também entrou, veio um dos guris e como a querer tirá-la do elevador. Ela, aos gritos, dizia que não queria sair, o restante da turma aplaudia o fiasco. Os franceses olhavam com jeito de desdém, os demais, perplexos, tinham a expressão que simulava um grande ponto de interrogação.
Outro tipo, mais sofisticado é dos entendidos em vinhos. Não falo dos enólogos e Sommelieres haja vista que se trata da profissão deles, sendo obrigação a apresentação de pareceres técnicos sobre os vinhos. Falo sim dos consumidores metidos a entendidos. Pegam o copo, elevam contra a luz e encontram não uma cor vermelha e sim “rubi”, no gosto não acham bom, gostoso, ótimo ou maravilhoso, e sim gosto de amoras silvestres ou canela. Os vinhos nacionais são no máximo bonzinhos, e os estrangeiros são sempre muito bons, mesmo quando detonados pela longa viagem ou grandes períodos nas quentes prateleiras dos supermercados. O seu gosto não interessa, o deles basta. Você tem a obrigação de adaptar o seu paladar ao deles, pois somente eles entendem o que é bom e o que é ruim. Se você gosta de tomar um bom vinho tinto com um pedaço de peixe, meus pêsames, você não está com nada. Não interessa se você gosta, se o seu paladar acha maravilhoso, ele está enganado, segundo os chatos do vinho.
A classe dos chatos mais em moda é a dos ECOCHATOS. Arautos do fim do mundo, vêem Armagedom à cada esquina. Tudo é motivo para pessimismo exagerado. Se faz calor, é por que está havendo aquecimento global. Se o frio está presente, é causado pelo esfriamento da terra. Ciclos naturais da terra de esfriamento e aquecimento não são levados em conta. Embora as estatísticas confiáveis não passem de um século, e o mundo tenham bilhões de anos, eles acham que estamos na hora de mudanças importantes, e que a sua ação pixotesca resolverá o problema. Para tanto não hesitam em perturbar a vida de todo o mundo.
As vezes você encontra um conhecido, e por questão de educação ao encerrar o papo, diz: aparece lá em casa. Não é que o sujeito aparece. Aí você tenta encurtar a visita mais não adianta, ele não se dá conta. O velho truque da vassoura atrás da porta não funciona. Não adianta dar corda no relógio dizendo, como meu falecido sogro : é foi-se o domingo. Ele não vai embora.
Finalmente, o tipo mais chato dos chatos, o sujeito que senta ao seu lado para uma longa viagem, e resolve contar a sua vida. Só existe uma saída: você leva uma bíblia e coloca no colo. O sujeito ao seu lado vai fingir que dorme a viagem inteira. Você somente corre um risco: o seu companheiro de viagem também leva uma bíblia...

Um comentário:

virginia disse...

Em relação aos ecochatos, existe uma subcategoria perigosa, a dos pseudo-técnicos em meio ambiente com cargos públicos. Tais técnicos (a maioria formada em antropologia, filosofia e outras matérias "afins" com o meio ambiente)tornaram a luta pela preservação da natureza motivo de chacota. É o clássico exemplo de uma curva íngreme na estrada de Ibiraquera que é ponto de constantes acidentes, inclusive com lesões graves. Tal curva é imexível, porque tem uma duna atrás. Não se pode remover a duna (que aliás é móvel), mas podemos nos quebrar na curva. Afinal, o homem (nós) fazemos ou não parte do meio ambiente? Será que também sou uma chata burguesa que quero destruir o mundo (mesmo separando meu lixo, tratando meu esgoto da praia, fazendo meu próprio adubo orgânico)????? Virginia

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