quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

UM ENSAIO SOBRE A IGNORÂNCIA

No final dos anos cinqüenta, eu ia e voltava de São Gabriel, minha terra natal, pela Maria Fumaça. Nada mais; nada menos do que um trem puxado por uma locomotiva a vapor.
Ia serpenteando a pampa, em milhares de curvas até chegar à Terra dos Marechais. ( Diziam as más línguas que as ferrovias foram construída por metragem, daí as curvas desnecessárias)
Tomava-se um trem em Porto Alegre até Santa Maria – o centro ferroviário do Estado- daí toma-se outro comboio para Cacequi, onde,finalmente, fazíamos a última baldeação para a composição que ia para Bagé, e nos largava em São Gabriel.
Praticamente, vinte e quatro horas de viagem.
- Guri não bota a cabeça prá (sic) fora que a ponte vai de arrancar a tua cabeça.
Eu achava aquilo tudo ótimo, afinal de contas saía da minha vida caseira para percorrer o mundo.
Eu não tirava os olhos da janela do trem, onde evidentemente a paisagem menos distante passava correndo, mas a mais distante demorava um pouco mais ( relatividade)
Já, minha mente de menino sentia um pouco de pena daqueles moradores dos ranchinhos de torrão cobertos por capim Santa Fé, ou simplesmente sapé, como diz a canção sertaneja. Distantes de tudo e de todos. A casa mais próxima ficava, não raro, quilômetros de distância.
Estavam ali parados no tempo, sem qualquer assistência social de governo, somente contando com a providência divina para protegê-los.
Hoje sei que a ignorância os protege.
Vejam bem, ignorância não é sinônimo de burrice, pois é simplesmente um desconhecimento de outras situações da vida.
Em não vendo as lanternas da cidade, não se iludem. Em não assistindo toda a sorte de tentações que entram pela televisão, não se sentem infelizes.
Por outro lado, ignorância é falta de conhecimento, que é um passo à incapacidade, e que pode ter como conseqüência a recusa em adquirir conhecimentos, mesmo quando disso depender sua própria sobrevivência.
Em suma, corre o risco de se transformar em requintada forma de perversidade, como diz GUSTAVO DE CARVALHO.
Este verdadeiro culto à ignorância tem se espraiado pelo pindorama desde que aos homens da lusa terra deixaram a Península Ibéria e cá se instalaram.
Eu, para entrar na moda, já estou ensaiando um ar de ignorante – se é que preciso de esforço –.Quem sabe não arrumo uma boquinha no planalto?


José Osnir

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