domingo, 1 de novembro de 2009

TEMPOS DE SAUDADE

Quando era apenas um garoto, acompanhava meus pais aos cemitérios. Tínhamos poucos túmulos para visitar aqui em Porto Alegre, pois éramos forasteiros. Nossos familiares mortos estavam lá em São Gabriel, donde saímos no lombo de uma velha Maria Fumaça. A maioria deles nem meus pais conheceram, ou pouca convivência tiveram.
Lembro de minhas visitas a um cemitério no campo, em minhas idas de férias à Terra dos Marechais, chamado Cemitério das Canas. Embora eu tenha procurado as tais canas em volta do cemitério nunca vi. Era um cemitério pequeno no meio de campos, em coxilhas que se iam subindo e descendo. O silêncio ali era arrepiar os cabelos do braço. O silêncio amedrontava principalmente as crianças.
Um barulho, porém, me marcou: as pessoas colocavam muitos enfeites de latas nas sepulturas, e elas batiam com o vento. Nunca me esqueci daquele barulho insólito. Até hoje abomino aqueles enfeites que existem em lojas de presentes ou antiguidades, compostos por pequenas barrinhas que batem ao menor sinal de vento. Lembram os barulhos do cemitério da campanha: Cemitério das Canas. Soa para mim como mau presságio. Sei que é bobagem, mas faço uma relação subconsciente, inevitável, portanto.
Nunca esquecerei quando um dia vínhamos de uma visita a uma fazenda no interior de São Gabriel, quando encontramos um caminhão com um caixão bem no meio da carroceria, e o povo em volta. Paramos e o caminhão também, descobrimos que o morto que era um nosso parente, casado com uma tia de meu pai. Imagem que não poderia deixar de ficar gravada em meu cérebro de menino.
Não gosto de ir a cemitérios em dia que estão cheios, como o dia de finados, embora quase sempre cumpra o ritual. Acho que este tipo de visita é muito íntima para ser compartilhada com muita gente.
Geralmente vou até lá quando não tem ninguém. Sei e sinto que as pessoas não estão ali, nem meus fantasmas. Aliás, há muito tempo que não me visitam, embora ainda os sinta me protegendo, pelo que lhes sou muito grato, e certamente eternamente o serei. Acho por meu lado, também não os tenho decepcionado, pois continuo a mesma pessoa que eles conheceram, com todos os meus defeitos e alguns atributos. Certamente não os tenho feito passar vergonha, onde quer que estejam. Acho que na hora da prestação de contas certamente terei muito pouco a saldar.
Como um filme todos os meus afetos passam por meu pensamento, nem os ideais de fé me consolam de não vê-los mais. Tem gente boa de mais neste rol de saudade. O tempo disfarça mas não afasta o nosso inconformismo.

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