sábado, 19 de abril de 2008

PESSIMISTAS A FAVOR

Em algumas coisas, este vosso amigo é radical (alguns dizem que é em muitas). E, uma delas é quanto ao papel da imprensa. Entendo que jornal bom é de oposição. Jornalismo a favor só diário oficial. Precisamos da imprensa como guardiã principalmente da moral da nação. Daí ficar fulo da cara (para não dizer puto da cara) com jornalista adesista. Aqueles que estão sempre prontos a arranjar uma desculpa para livrar a cara do governante de plantão. Os que diante de uma mancada evidente do presidente da república vão revirar no passado para encontrar bobagem equivalente de governantes anteriores, para justificar o gesto ou ato do atual.

Já, quanto aos poetas entendo plenamente justificável que alguns sejam otimistas e outros pessimistas. Confesso que tenho uma certa queda pelos pessimistas, pois os acho muito mais profundos. Deles podemos tirar as melhores lições.

O carro chefe dos poetas tidos como pessimistas, que inaugura em pleno século XIX o que se costuma chamar de os “poetas malditos’, e que influenciou, sobretudo, os poetas simbolistas, é o francês Charles Baudelaire Se costuma dizer que nunca houve quem fosse tão radical e ao mesmo tempo tão brilhante.

Vou ser bonzinho com vocês e apresentar Baudelaire em tradução brilhante de Ivan Junqueira, numa modesta palinha do que é este gênio da poesia:



Uma carniça

Lembra-te, meu amor, do objeto que encontramos
Numa bela manhã radiante:
Na curva de um atalho, entre calhaus e ramos,
Uma carniça repugnante.

As pernas para cima, qual mulher lasciva,
A transpirar miasmas e humores,
Eis que as abria desleixada e repulsiva,
O ventre prenhe de livores.

Em seus passos, temos evidentemente o nosso maravilhoso AUGUSTO DOS ANJOS, autor de um único livro EU, cujo exemplar de minha propriedade já está gastinho de tanto ler.

Para quem não lembra, ou gazeteou a aula de literatura brasileira, é o autor de VERSOS ÍNTIMOS, onde temos os famosos versos que nos escandalizavam nos bancos do ginásio: Se a alguém causa inda pena tua chaga,/Apedreja essa mão vil que te afaga,/Escarra nessa boca que te beija!

(Hei, que nojo!)

Existem ainda poetas que não são tão lúgubres como Baudelaire ou Augusto dos Anjos, mas são também pessimistas. Alguns consagrados em suas obras. Lembre-se de AS POMBAS de Raymundo Correa:

...Os sonhos, um por um, céleres voam,
Como voam as pombas dos pombais;

No azul da adolescência as asas soltam,
Fogem... Mas aos pombais as pombas voltam,
E eles aos corações não voltam mais...

Falava ele dos sonhos que não voltariam mais. No entanto, penso como nosso velho e bom professor FARAD os sonhos não precisam voltar, pois eles nunca vão...

Mas é um poeta pessimista.

Quer ver outro.

Nos livros do nosso tempo de colégio, onde recebíamos aulas de professoras e não de “educadoras”, no livro de Cecy Cordeiro Thofern, falecida há pouco tempo, havia a poesia de Guilherme de Almeida Barquinhos de Papel:

Quando a chuva cessava e um vento fino
franzia a tarde tímida e lavada,
eu saía a brincar, pela calçada,
nos meus tempos felizes de menino.

Fazia de papel, toda uma armada;
e, estendendo meu braço pequenino,
eu soltava os barquinhos, sem destino,
ao longo das sarjetas, na enxurrada...

Fiquei moço. E hoje sei, pensando neles,
que não são barcos de ouro os meus ideais:
são feitos de papel, são como aqueles,

perfeitamente, exatamente iguais...
- Que os meus barquinhos, lá se foram eles!
Foram-se embora e não voltaram mais!

Ora, a este poeta também os princípios do prof. Farad: os sonhos não podem ir embora. Se os realizamos vamos à procura de novos. Eles são a razão da vida.

Mas o que eu pretendo dizer é que embora os poetas sejam pessimistas, a forma de dizer a sua mensagem é muito bonita, tem conteúdo.

Os ufanistas, por seu turno, pintam um lindo quadro, que até tem um bela roupagem sob o ponto de vista poético, agradável aos ouvidos, mas desprovidos de qualquer profundidade, por isso prefiro os pessimistas, embora eu seja um otimista incorrigível, como já me dizia um dileto amigo que já se foi.

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