Pois ontem de noite resolvi ler a denúncia feita pelo Ministério Público Federal. Sãos mais de mil folhas. Um velho bacharel como eu, no entanto, sabe o que é preciso ler, e que pode passar por cima. Ao final da leitura, cheguei à conclusão que é tão vazia quanto um pastel de rodoviária. A maior parte é gasta com conversas telefônicas entre Lairs e Marcelo. Também existem muitas outras conversas telefônicas entre inúmeras pessoas.
A denúncia contra a governadora do Estado do RGS se baseia exatamente na menção ao seu nome nas conversas telefônicas, não existindo nada de concreto, nenhum documento firmado, nenhuma conversa telefônica da própria, enfim, nada de provas concretas.
Se a moda pegasse, a gente podia colocar uns amigos conversando ao telefone, ou a nós mesmos conversar com alguém por telefone, e começar a dizer que um desafeto nosso é ladrão, que vive roubando dos outros, que é um salafrário e estelionatário. Depois era só repassar a gravação para o Ministério Público, e pronto já detonamos o nosso inimigo.
Não estou aqui para inocentar a governadora, em primeiro lugar porque somente sei do assunto pelos jornais, em segundo lugar, não gozo da convivência com nenhuma das partes envolvidas, mas faço questão de defender a idéia de que para se acusar alguém é necessária, adrede, a reunião de provas concretas.
O ônus da prova é todo do acusador. O papel do defensor é derrubar as provas que forem apresentadas na peça de denúncia, incluindo álibi, provas documentais e testemunhais. Se as provas de acusação não existem o papel da defesa é facilitado em muito.
Sim, e daí, bom para a governadora, então? Não, vejo dois problemas: o primeiro, o processo se arrastará muito além do mandato da governadora. Teremos o período de instrução do processo, audiências, oitiva de testemunhas, coletas de eventuais provas supervenientes, e finalmente uma sentença de primeiro grau. Dela certamente haverá recurso por uma parte ou pelas duas. Mesmo no caso de absolvição, sempre ficará a dúvida: foi absolvida somente por falta de provas. Não seria, por acaso culpada, mas a mão da Justiça simplesmente não a alcançou? No segundo problema, haverá a tal CPI. Acontece que uma Comissão Parlamentar de Inquérito faz um julgamento político e não jurídico. Quando a CPI inicia a oposição já sabe como votar, idem a situação. Trata-se de filme com solução no título: O assassino era o mordomo. Um exemplo típico deste tipo de situação foi o caso Collor que foi cassado, e absolvido pelo Supremo. Estava errado o STF? Não, simplesmente este aplicou os princípios de direito, incluindo a ampla defesa, o contraditório e a exigência de provas, coisas que numa CPI, não raro, ficam ausentes. Por esta linha de raciocínio – que me parece o mais certo acontecer – a senhora Governadora sairá sempre perdendo. Se for injustiça a história dirá. O processo assim proposto duvido muito que alcance alguma coisa em matéria de solução para o problema.
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* Para os não atentos: parafrasiei o título da peça de Eugène O'Neill cujo título em inglês é Long Day's Journey into night.
Existem duas pessoas inviáveis dentro de mim: a primeira, a que os meus inimigos imaginam; a segunda, a que os meus amigos propagandeiam.
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